Em Lucas 2:52 é dito que Jesus “crescia em sabedoria, estatura e graça diante de Deus e os homens”. Um versículo pequeno, mas que traz uma ideia muito complexa para a época: o ser humano apresenta quatro vertentes indivisíveis que precisam ser desenvolvidas em equilíbrio para que tenhamos felicidade. Precisamos cuidar do corpo, da mente, da nossa espiritualidade e do nosso convívio social - tudo junto e ao mesmo tempo.
Muitos cristãos vão contra isso ao aplicarem erroneamente o texto “o espírito na verdade está pro nto, mas a carne é fraca” (Mat. 26:41) ou “o espírito é o que vivifica, a carne para nada aproveita” (João 6:63). Entendem que o corpo é uma mera habitação provisória da alma, que não precisa ser cuidado com tanta disciplina. Porém, os textos querem, na verdade, construir uma antítese entre o homem natural, não convertido, com a tendência de sempre procurar se salvar pelas obras - representado pela “carne” - e o cristão, convertido e transformado no Espírito Santo, salvo pela graça de Cristo. Os textos nada têm a ver com o estado de consciência após a morte. Estão focados no desenvolvimento humano em vida, particularmente o desenvolvimento “na graça” - a comunhão espiritual, o processo de santificação guiado pelo Espírito Santo.
Tal conceito ecoa em uníssono com a percepção trazida por Paulo em 1Co. 6:19, o corpo como “Templo do Espírito Santo”. O processo de santificação, de crescimento espiritual, deve também nos mover a sermos cuidadosos com nosso físico e mente, bem como nossa rede social, já que se influenciam mutuamente.
Paulo dá uma ênfase interessante na parte da saúde mental particularmente no texto presente em Filipenses 4:18 - “tudo o que é verdadeiro, tudo o que é honesto, tudo o que é justo, tudo o que é puro, tudo o que é amável, tudo o que é de boa fama, se há alguma virtude, e se há algum louvor, nisso pensai”. Está aí uma lição que, nós como cristãos, gostamos de ignorar e pagamos o preço por isso.
Como humanos, damos muita ênfase ao comportamento externo, mas Cristo focou o Sermão da Montanha inteiro em tentar mudar nossa visão em relação a isso. O problema está no pensamento.
Temos a tendência de achar que nossos pensamentos têm vida própria, que não podemos controlá-los. Apesar de em alguns transtornos psíquicos esse autocontrole ser muito difícil, ainda assim é parte do tratamento psicoterapêutico aprender a desenvolver esse controle. Por exemplo, entender que vozes e vultos são alucinações na Esquizofrenia, que é possível resistir aos rituais e obsessões do Transtorno Obsessivo Compulsivo, que as emoções intensas não são confiáveis no Transtorno Bipolar, etc.
E se alimentamos os pensamentos com coisa boa, eles ficam mais comportados. Se alimentamos pensamentos de medo, de desconfiança, de baixa autoestima ou os excitamos com sensualidade, violência e irreverência, fica mais difícil vencer a guerra.
Romanos 12:1 e 2 diz: “Portanto, irmãos, rogo pelas misericórdias de Deus que se ofereçam em sacrifício vivo, santo e agradável a Deus; este é o culto racional de vocês. Não se amoldem ao padrão deste mundo, mas transformem-se pela renovação da sua mente, para que sejam capazes de experimentar e comprovar a boa, agradável e perfeita vontade de Deus”. Renovação da mente como nosso sacrifício vivo, nosso culto racional - em uma linha resumido todo o processo de santificação.
Consequências práticas
O processo de santificação exige o verdadeiro exercício da vontade. O eu deve escolher a cada momento vencer a carne e preferir o Espírito. Isso não é salvação pelas obras! O foco não deve estar no comportamento, mas no pensamento.
Cada pessoa tem sua história, seus traumas, suas dificuldades e limitações. Esse processo de renovação da mente é progressivo, gradual e cada um tem a sua velocidade. Alguns vão tropeçar mais, outros menos. O importante é ser um movimento constante e decidido.
Muitos transtornos psíquicos interferem nesse exercício da vontade. Não é nenhum pecado procurar ajuda para fazer isso melhorar. Psicoterapia e a prescrição correta de medicações podem ser grandes aliados!